segunda-feira, 16 de julho de 2012

Eu só queria um trabalho.




Esta foi uma frase que ouvi de um morador de rua que chamarei de Gaúcho.
O Gaúcho saiu de sua terra natal no RS com destino a São Paulo alimentado pela lenda de que a referida cidade é o lugar da oportunidade.
Chegando a seu Eldorado, ao desembarcar na rodoviária do Tietê assim como muitos, foi roubada sua mala maior, e levado o dinheiro que trazia e achava que tinha guardado em lugar seguro, ficou com alguns documentos.
Nascia ali graças a esses conhecidos em sua forma de agir que muito mais que bens transitórios roubam, roubam sonhos expectativas e dignidade.
Gaúcho chega a uma das tendas conta seus sonhos e expectativas e toda equipe o incentiva a continuar, fica em um lugar de acolhida, enquanto sua identidade é emitida participa das oficinas sorrindo otimista, 
ele seguiu algumas dicas de emprego, procurou achou, passou pelo processo seletivo, foram pedidos os documentos ele radiante, depois que a assistente social deu-lhe uma declaração para comprovar-lhe o endereço, " a necessidade do CEP”, foi tirar as fotos, e saiu da tenda de convivência, radiante de começar o trabalho no dia seguinte…
Quando nas ruas da Mooca ele é novamente roubado e desta vez levam-lhe tudo, todos os seus documentos, seus sonhos e sua dignidade e sua sobriedade…
Encontrei o Gaúcho em outra tenda de acolhida bêbado e narra-me a historia, naquele espaço de tempo de sua chegada da conquista de emprego, nunca havia bebido…
Agora estava bêbado…
Questionando-me como agora:
Como eu consigo o certificado do ensino médio estando tão longe de minha casa?
Olhou-me com olhos úmidos dentro de meus olhos, disparando-me a frase que me apunhalou o coração     e levando-me as lagrimas , roubando meu sono e minha alegria, e fustigando minha alma…
"Ricardo eu só queria um trabalho… É pedir muito um trabalho? "
Aquilo dizia e diz a minha alma… Diz e ecoa assim:
"Eu quero honra. "
"Eu quero dignidade. "
"Eu quero uma vida produtiva. "
"Eu quero ser útil. "
Temos tantos assim na rua, que se perdeu, que roubaram sua dignidade, se ele perder o centro de acolhida que não acolhe os que bebem durante o dia, e se distanciar das tendas poderá sujar suas roupas e realmente ficar definitivamente a margem da sociedade, pois no momento que sujar suas roupas, será recebido pela porta dos fundos dos restaurantes, irão mudar de calcada ao ve-lo, irão abaixar a cabeça ao passar por ele, irão mudar de banco no ônibus ou metrô quando ele sentar…
Já vi muito esta cena repetir-se…
Precisamos humanizar a humanidade…
Nestes últimos dias fico orando pelo Gaúcho porque sinto minhas mãos atadas…
Sei que pela lei de causa e efeito ele não é inocente, mais sei também que sou responsável por aquilo que cativei pelo que conquistei de amizade…
O que me uniu ao Gaúcho pergunto-me…
Será que a contabilidade divina?
Pouco importa, pois a paternidade divina é comum sendo assim somos irmãos e isso me basta para que me torne responsável…
Enquanto o frio corta e me coloca embaixo da coberta estimulando minha preguiça.
A chuva canta no telhado de minha casa como uma cantiga de ninar, tem muitos Gaúchos pelas ruas de Grandes cidades talvez molhados e sujos tremendo de frio…
Dizendo como alguns brincavam ontem na tenda…
Segurança desliga ai o ar condicionado um pouquinho, pois está frio…
Ou algum dele dizia: fecha a porta da geladeira que você deixou aberta.
Essa é a forma que o brasileiro lida com suas dores satirizando-as, rindo.
Mas isso não tem nada de engraçado, isso é pobreza dos ricos...
E ao mesmo tempo em que é a riqueza dos pobres…
Precisamos nos igualar, olhar para os lados e pensar existe muitos Gaúchos nas ruas, muitos moradores que entregam dinheiro achado aos seus donos, que apenas querem um trabalho, apenas querem ganhar seu dinheiro com o suor de seus rostos, alimentarem o sonho que é só dele…
Eu penso que o Gaúcho seria mais feliz no aconchego de seu lar, nos braços dos seus, mas ele sonha , seria eu mais um a roubar-lhe o sonho dizendo o que penso…
A verdade dele poderá ser maior do que tudo que realmente acredito ele voltar a encontrar-me em uma nova posição social.
Desejo que você que lê neste momento se descubra a casa da humanidade.
Que você de um passo em nome do amor seja, com seu coração, com sua atitude ou com sua oração,  a casa de muitos, pois muitos e muitos deles, só querem um trabalho.




Ricardo de Lima


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